Diário do Pina

O verão chegou – 18 de outubro de 2020

Aviso aos navegantes: o verão chegou. O sol largou a preguiça de ficar até cinco e meia nos últimos cochilos, embaixo das cobertas, às vezes para dar as caras só lá pelas sete. Hoje, cinco em ponto, nasceu no seu mais lindo alvorecer: dentro do mar. Como já não tenho cortinas na sala, ele entra sem cerimônia na minha casa, cozinha a dentro, até a última parede, onde está a geladeira.

Já tomei a primeira parte do café da manhã, frugal, a maré está cheia, o jeito é caminhar pelo calçadão. Dia luminoso. A essa hora, mais corredores que caminhantes. Os automóveis e as motos ainda são poucos na avenida. As ondas chegam a meus ouvidos, e não me furto a um sentimento de raiva dos motores quando interrompem aquele murmurar.

Passada a marca da cerâmica cinzenta para a vermelho tijolinho, vislumbro crianças nos balanços. Chegando mais perto, ouço as vozes adultas. Abro o portãozinho de ferro. Ao me aproximar do brinquedo imitando casinha, onde faço meus alongamentos, já dá pra saber que são jovens se despedindo da night. Quantas dessas despedidas, meu Deus do céu… Tem melhor? Apreciar corrida de submarino?

Um deles, vendo-me aproximar da escada tipo navio, sendo ela de sólidas toras de madeira,

– Dona Teresa, dona Teresa, a senhora quer ajuda?

Antes de subir a escada, olhei na direção deles. Na hora que entrei no parquinho, estavam tão entretidos na conversa, um dando impulso ao balanço da moça, que nem dei bom dia. Passei invisível, como costumam ser os velhinhos para a moçada nova.

Quando espiei para eles, vi que eram jovens bem nascidos. Sorri, e o que havia oferecido ajuda veio em minha direção.

– Você me conhece?

– Não.

– E por que me chamou pelo nome?

– Porque assim chamo a todas as senhoras que são da idade de minha tia-avó.

Nosso sorriso foi muito amigável. Eu não carecia de ajuda, faço isso quase todo dia. E ele voltou ao grupo, com ar de quem conta vantagem, dizendo da coincidência dos nomes.

            Aquilo me deu uma saudade de um neto que não tenho, que poderia ter essa idade, jovem universitário…

            No caminho de volta, o verão fervia. As carroças de mão voltaram a negociar. Os times já haviam tomado conta dos três campos de futebol. Vi um rapaz e uma moça que não corriam nem caminhavam: apenas andavam pelo calçadão sem pressa, proseando, ele enlaçando a moça no ombro, ela na cintura dele.

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