Chico Buarque 80

19 de junho de 2024. Hoje Francisco Buarque de Holanda completa 80 anos. A Rádio Cultura da Fundação Padre Anchieta dedica todo dia a homenagear o nosso compositor, cantor, poeta entre os grandes. Não consigo fazer mais nada além de ouvi-lo cantar suas canções, até dos outros, poucos, Cartola, Noel e Vadico, Ary Barroso, Dorival Caymmi. E fazer alguns passeios pela minha pretérita vida. Sou de uma geração que teve um grande privilégio: houve canções de Chico Buarque para cada pedaço de nossa vida.

Até quando nossos filhos eram pequenos, os de Chico e Marieta também eram, e houve a peça de teatro com aquelas músicas maravilhosas, pr’agente juntar às outras de cantar para os filhos. E sobrevivemos aos duros anos da ditadura militar ouvindo Chico Buarque. O exílio na Itália. O exílio de tantos. Caetano e Gil na Inglaterra.

Volta Chico Buarque ao Brasil. Censura prévia. A burrice dos milicos, deixam passar Vai Passar, até a ovação no Canecão, quando se deram conta e censuraram. Aí que a música virou o hino de protesto mesmo. E foi incorporada à campanha de Fernando Henrique Cardoso à prefeitura de São Paulo. Começo da abertura política. Minha vida era em São Paulo. O Movimento dos Profissionais por um Governo Democrático. Naquele tempo, congraçamento de todas as esquerdas. O amor era livre. Céus, quanta festa! A casa de outro Chico, o de Oliveira, no bairro da Pompéia, era um dos comitês da campanha de Fernando Henrique.

Isso foi antes do PT, que nasceu trazendo um verdadeiro partido, porém, ai porém. Com a contradição que é a vida, trouxe também a divisão, uma divisão estreita que só se aprofundou depois que voltou a democracia a nosso país. Um dos grandes comícios pelas Diretas Já, na Praça da Sé, calhou eu e Flora estarmos no meio de uns jovens que vaiavam todos os discursos: Franco Montoro, Ulisses Guimarães… E nós duas, com espírito de professora, Gente, estamos todos juntos por uma mesma causa. Mas de nada adiantava. Até que deliram quando chega Lula ao microfone. E eu, junto com eles, também: Aí conterrâneo! Nada entendiam. Parece que continuam sem entender.

E Chico continua cantando a sociedade brasileira, cantando o amor, a tristeza, a alegria, a vida. Sem trégua, compõe, canta. A mostrar que a arte não obedece ao descair do corpo. Que tenhas vida longa, Chico. Ver-te no vídeo hoje em dia mostra nossa idade, os de tua geração. Permanece teu sorriso, tua fina ironia, e teus olhos azuis, a me lembrar outros, verdes, que me acompanharam até o suspiro derradeiro.

Como se cada música de Chico Buarque nos levasse a um lugar, a um tempo. 1970. O apartamento 603B na avenida Conselheiro Aguiar. Eu atravessava a cidade, de Boa Viagem para a Cidade Universitária, carregando na alma e no corpo uma das mais belas canções de Chico, Samba e Amor.

E fico por aqui porque a vida segue. E essa breve crônica segue sem revisão, crua como nasceu, na emoção de ouvir nosso grande poeta.

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